domingo, 27 de dezembro de 2009

Entre Festas

Deitou-se com uma mão a cheirar a perfume e outra a cheirar a alho

Abriu o laptop e contemplou o perfil salgado dela

Sabia-lhe o seu gosto tanto quanto se enterrava no sofá sem sair do sítio

Uma corrente de inibições deu-lhe uma pontada na coluna, quando atravessou a manta grossa de algodão e lã, grossa...

Não era Natal se não o pudesse passar com os seus amigos.

Não passava de ano sem rodar uma taça de sei lá o quê pelos companheiros.

E ali estavam eles. O alter ego bêbado que nem uma esponja, não se aguentou muito até estar rodeado por uma poça de pedaços dele, sucos digestivos vários, membros e idiossincrasias de um barril de Porto. Os outros deixaram o moço a dormir, já sabiam que aquilo ainda dava umas piadas para animar a madrugada, com todos a cair e ele com a genica e dor de cabeça.

Entretanto as várias personas viam vídeos antigos, e nem se queixavam nem ligavam nem se lembravam que os pudessem alcançar, no fundo estava tudo aguentando aquelas trágicas comédias passadas à espera da hora do karaoke.

Bem, mais um pouco e dormia, aí é que eles se iam divertir. Mas não se divertia ele, ia ser excluido pelos seus amigos, os seus companheiros. Que luz irritante, decidiu-se a desligar o computador, ah, é verdade, já me esquecia de ti. Já te tinha dito que és boa? Nunca te disse! Nunca lhe tinha dito. Também nunca lhe tinha dito que precisava da mão dela e dos seus olhos para dormir. Não que fosse necessário para dormir, mas se sabia bem... Claro que outras coisas lhe sabiam bem, como, por exemplo, o seu rabo. Há que fazer escolhas. Como não lhe disse nada, decidiu adormecer, é porque a passagem de ano no bar onde trabalha ainda deu muito chão por onde esfregar. Bom Natal rapaziada, e bom ano.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

O homem guarda os cheiros em gavetas
E funciona assim, abre a gaveta e cheira
Depois fecha a gaveta e procura novos cheiros

O canguru guarda cheiros numa bolsa,
Pois é a única bolsa que possui pelo que não tem outros locais onde guardar cheiros

O utensílio alguidar guarda cheiros na borda
E se o homem soubesse
Só comprava bordas de alguidar

E tu? Tu vens e vais mas deixas o teu cheiro
O cheiro é forte quando vens e é teu quando vais
Eu guardo-o fora da gaveta, para me lembrar
Mas ele teima a ir também
Então tens que voltar

Já te vais embora?
Então deixa aqui o teu cheiro

domingo, 6 de setembro de 2009

A Bolha Disforme

A bolha disforme era uma bolha disforme
E não era conhecida

A bolha disforme era uma bolha disforme
Porque não era conhecida

Passou ele perto e passou-lhe os olhos
Pela bolha, não tão disforme
Não tão desconhecida

A bolha é conforme, e já não tão disforme,
a bolha é conhecida!

Ele a conhece e ronda a bolha conforme
ela deixava ser conhecida

Era um borrão de fractais desenfreados
Eram histórias de bonecas
Eram sustos de pernetas
Eram coisas reais
Eram cenas demais
Eram cavalgadas com animais cansados

Então a bolha conforme
ia sendo conhecida

Lembra-lhe a hora da abalada
Lembra-lhe a hora da despedida
Num lapso a bolha volta a disforme
Lembra-se de ser incompreendida

Num desespero próprio de disformidades
A bolha tem um brilho de lucidez

Um passe de cartola entre pombas
Lembra-se de contactos que ela fez

Retomaram-se então contactos
Mas quão perto é o longe
Que a bolha se tornara disforme?

Refizeram-se então contactos
Mas quão perto é o longe
Longe que tornara a bolha disforme?

Pois é

Agora a bolha é outra bolha
Cheia de fractais moderados
Cheia de contos de princesas
E sustos de condensas
Cheia de coisas surreais
E de outras, menos reais
Cheia de cavalos embriagados


E essa é a sua bolha, a sua bolha disforme
Até voltar a ser a sua bolha, a sua bolha disforme

quarta-feira, 15 de julho de 2009

A Ameaça

Quando estás longe, tudo bem, mas quando te começas a aproximar... Primeiro, há um choque, um pico do sismógrafo que acabou de ser ligado. Depois há um agradável blend de cheiros, a perfume, a batôn, a ti. Pode cheirar a merda na rua, quando chegas cheira a ti. Enquanto se fica enebriado por esses cheiros é que aproveitas para atacar (olha que aproveitar quando um gajo está entorpecido é baixo). Já estás ali ao lado, logo ao lado, mesmo ao lado.

Em Setembro é melhor, porque em Setembro cheira a humidade de chuva recente no ar e há folhas castanhas. Ou então em Outubro. Tem é que ser à noite. Mas parece que apareceres noutros meses é igualmente opção para ti. Isso para ti é apenas uma moita mais cerrada, para o ataque ser mais de surpresa! És o único felino que ronrona quando quer atacar.

Há os que se esquecem, acredita, só lhes voltas à memória na noite de ataque seguinte, semanas ou meses depois, conforme disponibilidade de um e doutro. Esses são os românticos.
Depois há aqueles em cuja memória ficas a bater ferro muito tempo. "Será que vai, ou não vai?" Esses são os parvalhões. Não queiras nada com eles (não que não saibas escolhê-los bem, mas às vezes...).

Enfim, é enfim que tenho a dizer. Inspirar fundo, como quem suspira calmo, mas que na verdade está a querer beber mais um golo de inspirações diluidas no ar. És assim. Nunca to tinham dito? Pois olha, és assim. Também, pode dizer-se que os lirismos acabam depressa aos romanticos, que aos outros, os parvalhões, nunca lá passou. Daí a complexidade em escrever-te algo. Só restam algumas arranhadelas como testemunhas do teu silencioso, mortal, sanguinário ataque.

Chiu... lá vens tu outra vez

quinta-feira, 9 de julho de 2009

A Saga da Senhora que Comprou uma Geringonça - Prosa

Para servir as suas necessidades de ocupação de tempo, a Dona Apolinária comprou um computador. Entusiasmada, abriu-o, desviou o napron da mesa da sala, espalhou as peças e montou-o. Orgulhosa do seu feito quis experimentá-lo, pelo que decidiu escrever o seu nome. Ligou a máquina, iniciou um novo documento no processador de texto e escreveu: "Apolinária". Ficou contente. Desligou o computador.

Um instante depois de o novo companheiro deixar de suspirar, lembrou-se que o seu primeiro nome era muito singular, demasiado singular, e essa singularidade incomodava-a. Então, ligou o computador. Deixou escrito "Apolinária Bento". Sorriu. Que lindo. Desligou o computador.

Logo depois de se ter levantado para ir lavar as suas pantufas, Dona Apolinária estacou. Não tinha dado nome ao ficheiro... Ligou o computador. Abriu o ficheiro "Sem Título" e guardou-o como "Nome". Em êxtase, deleita-se com o feito, enquanto o computador desliga.

Levantou-se. Tropeçou, no tapete e nas suas ideias. Um ficheiro com um nome chama-se "Nome"? Não era um nome, era o seu nome! Ligou o computador. Alterou o nome do ficheiro para "O Meu Nome". Desligou o computador.

Lembrou-se que algo já tinha o nome de "O Meu...". O que era? Ligou o computador. Bem na frente dela um nome piscava: "O Meu Computador". Ao lado deste, a existência de um ficheiro chamado "O Meu Nome" tornava o computador da Dona Apolinária repetitivo. Alterou o nome do ficheiro. Desligou o computador.

A Dona Apolinária ofereceu o computador à neta. Comprou um massajador facial.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Os Pacholas - parte I

A mesa de jantar abarca

Pachola-filhos, que pai não demora

A longa espera pelo patriarca

Envolve notícia, boa ou da hora…


Cruzam-se conversas à nova

Pois o regente enche-se da alvíssara

A audiência conversa ansiosa

Ele só começa porque esta lho pedira


Diz Pachola-pai a repeito

"De muito demorada encenação:

Pachola-filho não dormia só

Tanto que saiba, do início da estação"


Sobre o primogénito falava

Falava, e o público suspendia

De tal facto só o perdoava

A descoberta da que o movia


Pachola-velha estava presente,

Escondia-se com tamanho escândalo;

Pacholas-filhas, com olhar de rente,

Escondiam risos sobre esse engano


É dada a palavra ao delator

"Sei que tirei bom usufruto

Mas quem tendes que procurar

É a quem retribuí com tributo"

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Afinal é assim

No mundo de Jonas
As coisas são como são
Água é água, gelo é gelo
Duche é banho de imersão
Dizendo-se a água menos gelo
Ou o gelo menos vapor
Dizia-se pela água se via o gelo
E pelo gelo, perfeição

Afinal tudo é água,
Afinal tudo é feição
Afinal tudo é tudo
E nenhum não é não
Assim se encontra a pureza
Levíssima subtileza
Dos produtos que se vêm
Dos produtos que se vão

domingo, 5 de abril de 2009

Sexta à noite

Sexta à tarde regresso do meu sapato
Chama-me o sofá tumultuoso
Ainda ligado? Ah, já alguém o tivera adormecido hoje...
Pois, ainda deitam vozes, algo de muito ténue
"il bambino... grazo cazzo..."
"si... siii... Siiii!"
Era esta a mistura latina ouvida
Desconfio por não se ouvir o francês (ouve-se sempre francês...)
Mas não divaguemos: a sua voz latente ressoa
Porém, ah! o que é isto? vem desta caixa
Não pode ser... o gajo deve ser um ventríloquo ou assim
Pelo menos é assim que o vejo
Há uma crosta, uma litosfera, um lençol fluvial
Pesado, pesado... no entanto tão convidativo
Era este que me chamava? não vamos especular
Vamos antes dar-lhe uso, vamos subverter a latência geral.
Vamos à luta! Juntos derrotaremos o sistema!
Não, não vamos. Hoje não, hoje vamos ouvir palavrões em italiano
Em espanhiliano, é mais o que estamos a ouvir...
Chamo-lhe um truque, mais um mexicano.
Seja o que for, não interessa
Vou voltar... está lúcido... lúcido...
Lá está outra vez o corvo:
nunca mais, nunca mais!
Nunca mais?...
Nunca...
Mais...
esta noite é sexta
e adormeci no sofá
debaixo de um edredon
e a ver televisão estrangeira

Eles!

Eles estão por todo o lado
Eles são convencidos
São demitidos
Nunca desistem
Nem se comprometem

São completares e bipolares
São indesejados e alterados
Hipócritas e anedóticos
São puros e empíricos

Eles são socialistas
Anarquistas, comunistas
Sindicalistas e banqueiros
Eles são podres de dinheiro
E parece que querem mais

São sem-abrigos
São reis de si próprios
Não têm os pés na terra,
Guardando o seu local ao sol
Foram mal criados
Agora são bem educados

São mentirosos
Chauvinistas
Pateta-alegres
Terroristas
Eles não sabem
Eles não sonham
Mas têm altas vistas

Eles pensam, e pensam que sabem
Eles são marxistas e salazaristas
São Nietzsche, são Freud
São um coração mole

São indesejados e ultrajados
São expulsos, ociosos
São lixados e trabalhosos
São exilados e escrupulosos

Ai, eles!...
Eles são assim
Não há nada que os faça mudar
Eles são romanticos e racionais
Eles são platónicos e fiéis
São cabrões e chulos
São prostituintes de somas
São prostitutos de produtos
São pouco e são demais

Eles são excremento, são nojeira
São lama, terra má
São barro, gesso, porqueira
São do pior que há

Mas quem são eles?
Os vilões, os artistas
Os mundanos, proxenetas
Eles que são profetas
Quem são eles?

Não quero cometer a pífia imoral
De dizer que nós somos eles...
Mas não será de mais reflectir
Nos tempos propícios à arte
(E técnica, convenhamos)
Sobre a verdadeira
Parte de nós que são eles

domingo, 8 de março de 2009

Temo que o que escrevo me engane
Por falta de experiência e objecção.
Por falta de consciência há os que objectivam
Que a própria ciência me trame

Temo que as palavras me iludam
Essas que pela minha mão nascem
Primeiras, eis que antes por outros
Foram escritas as putas da ilusão

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Um conto de Couves Frescas

Agora vou contar uma história:

Uma vez ia a andar num descampado quando encontrei um ácaro que estava a
rebolar na sua própria bosta. Cheguei-me ao pé dele e disse:
«Olá. Tu és um ácaro?»
E ele «Não, sou um minichimpazé»
E eu disse «E o que é que estás a fazer, mini-chimpanzé?»
E diz ele «Estou a rebolar na minha própria bosta»
E eu disse «Isso parece ser giro. Também posso?»
E ele disse «É pá, é um bocado complicado, porque como eu sou muito
pequeno, a minha bosta é muito diminuta»
E digo eu «Mas não há problema, que está ali uma poça de lama, e eu posso
rebolar lá»
Diz ele «Então vá»
E lá estávamos nós, a rebolar, a rebolar....


Esperem, afinal esta não é assim tão gira. Vou antes contar outra.

Uma vez estava eu num descampado quando de repente vejo uma cama. Então eu
perguntei-lhe:
«Olá. O que é que tu és?»
E disse-me ela «Sou uma cama»
E eu «E o que é que fazes, cama?»
«Olha, às vezes faço-me. Depois se vem alguém, desfaço-me. E depois volto a
fazer-me»
Digo eu «Que giro. E como é que te chamas, cama?»
E diz ela «Eu chamo-me Sutra»
E digo eu «Olha que giro. Tu não escreveste um livro ou assim?»
E diz ela «Não, isso foi a minha prima Alzira. Alzira Sutra»
Então eu digo «Ah. Olha, dás-me o número dela? É que eu conheço uma
livraria no Gaia Shoping[que por acaso não conheço] e era para saber se ela
podia ir lá fazer uma sessão de autógrafos»
E diz ela «Mas as Camas não dão autógrafos»
«E isso é porquê, porque não sabem escrever?»
E diz «Não, é porque não conseguimos pegar em canetas»
Digo eu «Mas não faz mal, ela cospe ou assim»
Diz ela «Então tá bem. Olha, se lhe ligares diz que vais da minha parte»
«O.k.»
Eu ligo-lhe e digo «Olá Alzira. Olha, vou da parte dela e é para perguntar
se podias dar uma sessão de autógrafos no Gaia Shoping... Não faz mal, cospes ou
assim... Então vá»

Então encontrámo-nos no Gaia Shoping, onde estava a decorrer
uma reunião de mini-chimpanzés motards. Mas como a gazolina para motas está
cara, eles anadavam só nas escadas rolantes para cima, e para baixo...
Então perguntei a um deles:
«Olá. Sabes onde é a livraria»
E ele disse «É ali ao pé dos golfinhos»
E digo eu «Golfinhos? No Gaia Shoping?»
E diz ele «Isto não é o Gaia Shoping, minha besta, isto é o
Zoomarine!»
«Ai então desculpe que foi engano!»

Então depois fomos para o Gaia Shoping e disse à senhora:
«Olá. Trago aqui uma cama que se chama Sutra e era para saber se dá para
fazer aqui uma sessão de autórafos»
Diz ela «Pois pode ser mas há um problema, é que a gente não tem o livro
dela»
Mas digo eu «Não faz mal, já vi que têm o Sr. Dos Aneis, pode ser mesmo
esse»

Estava ela a assinar o Sr. dos Aneis, quando aparece o Luke
Skywalker:
«fhuuu[expiração forte] I'M YOUR FATHER»
E digo eu «Que giro. Mas isso não era o Darth Vader que fazia?»
Diz ele «Sim, só que eu matei-o, mas como ele era o meu pai, ensinou-me
este truque antes de morrer. Queres ver o que eu sei fazer? Fhuuu, fhuuu
[expirações fortes]»
«Ah, que giro. Isso foi ele que te ensinou?»
Diz ele «Não, isto sou eu que tenho asma»
«Ah, olha que pena. É que nós estamos aqui a autografar livros, mas têm um
bocado de acção para quem tem asma. Mas olha, leva o terceiro volume, que é o
que é menos animado»
E ele «Tá bem»

Acabou a sessão de autógrafos e eu disse-lhe
«Olha, já que estamos por aqui, o que é que achas de irmos ao
Zoomarine?»
E ela gostou da ideia. Então descemos e fomos ao Zoomarine, e ao descer,
passámos por um ácaro num descampado. Fomos então nadar com os golfinhos. Mas
como a cama é de madeira, inchou e rebentou. PUM, PUM. Então o ácaro ouviu isto,
pensou que eram tiros e borrou-se todo. Quando eu o vi estava num descampado a
rebolar na sua própria bosta e já nem se lembrava de quem era. Então eu
cheguei-me ao pé dele e disse:
«Olá. Tu és um ácaro?»
E ele «Não, sou um
minichimpazé»
E eu disse «E o que é que estás a fazer,
mini-chimpanzé?»
E diz ele «Estou a rebolar na minha própria bosta»


Espera, parece-me que já tinha contado isto...

domingo, 15 de fevereiro de 2009

Que nem um passarinho

esta de surreal tem pouco
mas não posso deixar de pedir à minha lula para a escrever

Parece que existem, parece que insistem...
Querem que modele,
Que não seja eu a pensar por mim
Eu que sei como sou, e quero ser deixado ser

Ó gentil criatura feminina
Ó saudável ninfa, ó, gentil tágide
Livrai-me deste nojo, o de ser pensado
E de me entregarem as conclusões
Para não ter eu tempo de me pensar

Então

Eu quero que amar seja uma palavra que não existe!
Para poder usar livremente todas as suas flexões

Eu quero mas parece que existem, parece que resistem
As atrites sociais, são eles o que são
Sejam eles que forem!

Não sei se foram, não desconfio se reincidem
Não desconfiam se reincidem
(Que é pior)
Mas fazem-no
E fazem-mo
A mim
Que sei
E não necessito
Mas parece que existem
E não desistem....

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Fartice

Estou farto dos estúpidos,
Estou farto dos anormais,
Fartei-me dos cabeças cheias de fezes!
A vida toda rodeado de animais...

A embalagem provocará efeitos nefastos,
Então abram-na vocês, porra!
Então, abram-na vocês.

Ai, que isso não se pode chamar...
Não se pode chamar, maçãs podres!
Que quando a frustração irrompe pela sagrada inteligencia
Começa a tornar-se complicado de a impedir
Sendo a única vontade que a move,
A razão roubada pelos energúmenos
E por essa vontade, mais enrigecida fica
Ao encontrar na inteligência, aliada.

Fartei-me dos estúpidos e dos paspalhões
E fartei-me é sobretudo desassossego e cansaço
Por os tolerar (o que continuarei a praticar)
E por, com eles, ser obrigado a trabalhar,
Por parte apoioar este sistema
Que impede que duas criações que se completam
Possam na realidade exercê-lo

Desculpem-me os estúpidos e os cabeças-duras,
As bestas e anormais;
Salvem-se os estúpidos e energúmenos
Os paspalhões e os animais,
Sei que ao usar a sua graça, erramos, e errei
Mas deles já está garantido o alto descanso,
Por emprestarem o seu nome àqueles de quem me fartei

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Bem, é a ti este
Mas como a ti não o posso cantar
Cantarei-o a esta almofada

De um fôlego só o irei fazer sair
Pelo menos tentar, se a tanto não conseguir
De contar a ti, digo, à invertebrada
Aquilo que primeiramente senti,
Pois aqui fica a vontade registada!...
:
Será de seda o tecido que te cobre?
Ou de algodões selvagens, semeados em altitudes
Ou ainda de seixos, que habitem nas profundezas...
Sobre a tua tez tanto sei
Que sentes aquilo que sabes
Sobre mim deixas escapar

O teu escudo de vontades
Daquelas que movem passarolas
Que te defende das iniquidades
É esse o mesmo, o indefinido protector
Que da tua não-córporea identidade me separa;
Mas sendo o real imaginado de pouco me diz
Pois esse é mesmo em que,
Na altura em que o quebrei à espadeirada
Pouco me importara

Ó musas, ó tágides,
Ó tristes adorações que escapam de mim
Bocejos de despreocupação,
Não apareçam vós
Nas palavras de quem vos conta
Pois ninguém dos de vós bocejos solta
Contra aquela de quem venho aqui falar

Mas no entanto aí está
Parada, impiedosa,
Mas com uma pureza augusta
De quem consegue tudo abarcar
E consertar ao que deu colo
Pois sendo essa criatura atingível,
Consegue fugir mais
Que as adorações antes ouvidas

E eu
Tomado pelo cansaço
Encontro-me apenas sentado
Escuto
Recupero a respiração
E com um fôlego renovado
Reinvisto da imaginação
Para tentar repôr um bocado
Do que me faltará em coração